terça-feira, 21 de dezembro de 2021

BITCOIN

 

"Não se investe em bitcoin, se aposta em bitcoin" (MAE, 2020)

Quando se fala em aposta penso logo em fichas. 

Nas fichas dos ônibus da minha infância  primeiro. Naquela época as pessoas  adquiriam fichas do cobrador e, na saída, as inseriam num cofre próximo ao motorista. Esse, por sua vez, atento ao que era inserido, vez por outra acionava uma alavanca ligada a um alçapão e as rodelas de plástico eram tragadas para o compartimento inferior da engenhoca.

Mais tarde, as fichas estavam presentes também nos fliperamas, cassinos e até nas rodadas de poker, na maioria das vezes também de plástico ou, na falta, moedas mesmo, pois toda moeda serve como ficha, só precisa ter um bom tamanho e beleza.

Se toda moeda serve como ficha, o inverso pode não ser verdadeiro a depender do conceito de moeda, coisa de Karl Marx, mas antes vamos tratar do conceito de ficha.

A ficha se restringe a uma determinada área de dominância, o ônibus da minha infância, o cassino, a mesa de poker, os cupons do mercado, as "moedas" locais, exemplos mais corriqueiros, e servem à troca por serviços, mercadorias ou valores. Outra característica da ficha é estar sob o controle de um ente que cuida da sua emissão e circulação.

Diante do conceito acima, há de se concordar que ele abrange de forma larga o que conhecemos hoje como moeda.

Sem uma base única para relacionar todas as fichas, o que temos hoje é a conversibilidade de uma ficha em outra e, lógico, a rainha das fichas.

Se não temos uma moeda de verdade,  mais cedo ou mais tarde a criaremos, espaço que nos leva à questão primeira, o que é moeda, e à seguinte:

O bitcoin é moeda ou mais uma ficha? 

What is money?

O vídeo, acessível pelo link acima, produzido pelo Wall Street Journal, ilustra de forma bem divertida o que foi dito até aqui, embora traga uma importante característica da moeda, a existência de uma convenção ou contrato social que a torna aceitável como tal.

Originalmente, a moeda tomou a forma de pedras, conchas e miçangas. Curioso é o caso da ilha de Yap e suas Rai Stones. 


Elas foram trazidas de uma ilha vizinha e eram raras dada a dificuldade na extração e transporte. Isso mudou quando o navegador David O'Keefe naufragou nas imediações. Ele percebeu que poderia ir à outra ilha, e com métodos e ferramentas mais modernas, realizar a extração e transporte dessas pedras o que veio elevar de sobremaneira o seu suprimento e ao colapso do sistema.


sexta-feira, 27 de março de 2015

A BELEZA

 
 
A Beleza é o que o tempo a torna mais bela

sábado, 2 de agosto de 2014

O mundo é um moinho



 Pois é menina
 O tempo reduz a pó
Mas nunca a nada
E pela relatividade
Quão grande pode ser esse fardo
Tão pesado este pó

quinta-feira, 21 de março de 2013

Narcisismo







Características Diagnósticas
A característica essencial do Transtorno da Personalidade Narcisista é um padrão invasivo de grandiosidade, necessidade de admiração e falta de empatia, que começa no início da idade adulta e está presente em uma variedade de contextos. Os indivíduos com este transtorno têm um sentimento grandioso de sua própria importância (Critério 1). Eles rotineiramente superestimam suas capacidades e exageram suas realizações, freqüentemente parecendo presunçosos ou arrogantes. Eles podem presumir que os outros atribuem o mesmo valor a seus esforços e surpreender-se quando não recebem o louvor que esperam e julgam merecer. Um menosprezo (desvalorização) da contribuição dos outros freqüentemente está implícito na apreciação exagerada de suas próprias realizações. Essas pessoas constantemente se preocupam com fantasias de sucesso ilimitado, poder, inteligência, beleza ou amor ideal (Critério 2). Elas podem ruminar acerca de uma admiração e privilégios a que teriam direito e comparar a si mesmos com vantagem sobre pessoas famosas e privilegiadas. Um indivíduo com Transtorno da Personalidade Narcisista se acredita superior, especial ou único e espera ser reconhecido pelos outros como tal (Critério 3). Ele pode achar que somente consegue ser compreendido e apenas deve associar-se com outras pessoas especiais ou de situação elevada, podendo atribuir qualidades de "singularidade", "perfeição" ou "talento" àqueles a quem se associa. Os indivíduos com este transtorno acreditam ter necessidades especiais, que estão além do entendimento das pessoas comuns. Sua própria auto-estima é amplificada (isto é, "espelhada") pelo valor idealizado que atribuem àqueles a quem se associam. Eles tendem a insistir em ser atendidos apenas pelos "melhores" (médicos, advogados, instrutores, cabeleireiros) ou em afiliar-se às "melhores" instituições, mas podem desvalorizar as credenciais daqueles que os desapontam. Os indivíduos com este transtorno geralmente exigem admiração excessiva (Critério 4). Sua auto-estima é, quase que invariavelmente, muito frágil. Eles podem preocupar-se com o modo como estão se saindo e no quanto são considerados pelos outros. Isto freqüentemente assume a forma de uma necessidade de constante atenção e admiração. Eles podem esperar que sua chegada seja recepcionada com grande alarde e ficar perplexos pelo fato de os outros não cobiçarem tudo o que possuem. Eles podem "caçar" elogios constantemente, por vezes de maneira muito cativante. Um sentimento de intitulação manifesta-se na expectativa irracional destes indivíduos de receber tratamento especial (Critério 5). Eles esperam ser adulados e ficam desconcertados ou furiosos quando isto não ocorre. Eles podem, por exemplo, pensar que não precisam esperar na fila e que suas prioridades são tão importantes que os outros lhes deveriam mostrar deferência, e ficam irritados quando os outros deixam de auxiliar em "seu trabalho muito importante". Este sentimento de intitulação, combinado com uma falta de sensibilidade para com os desejos e necessidades alheias, pode resultar na exploração consciente ou involuntária dos outros (Critério 6). Essas pessoas esperam que lhes seja dado o que desejam ou julgam precisar, não importando o que isto possa significar para os outros. Por exemplo, esses indivíduos podem esperar grande dedicação da parte dos outros e sobrecarregá-los de trabalho sem levar em conta o impacto que isto possa ter sobre suas vidas. Eles tendem a formar amizades ou relacionamentos românticos somente se vislumbrarem a possibilidade de que a outra pessoa vá ao encontro de seus objetivos ou de outro modo aumente sua auto-estima. Eles freqüentemente usurpam privilégios especiais e recursos extras, que julgam merecer por serem tão especiais. Os indivíduos com Transtorno da Personalidade Narcisista em geral carecem de empatia e têm dificuldade em reconhecer os desejos, experiências subjetivas e sentimentos dos outros (Critério 7). Eles podem presumir que os outros se preocupam integralmente com seu bem-estar, e tendem a discutir suas próprias preocupações em detalhes inadequados e extensos, deixando de reconhecer que os outros também têm sentimentos e necessidades. Estes indivíduos freqüentemente desprezam e se impacientam com outras pessoas que falam de seus próprios problemas e preocupações. Eles podem não perceber a mágoa causada por seus comentários (por ex., dizer alegremente a um ex-companheiro: "Agora encontrei o amor de minha vida!"; alardear saúde diante de alguém que está enfermo). Quando reconhecem as necessidades, desejos ou sentimentos alheios, tendem a vê-los como sinais de fraqueza ou vulnerabilidade. Aqueles que se relacionam com indivíduos com Transtorno da Personalidade Narcisista tipicamente descobrem neles uma frieza emocional e falta de interesse mútuo. Estes indivíduos freqüentemente invejam os outros ou acreditam que os outros têm inveja deles (Critério 8). Eles podem guardar rancor pelos sucessos ou posses dos outros, achando que seriam mais merecedores destas realizações, admiração ou privilégios. Eles podem desvalorizar rudemente as contribuições dos outros, particularmente quando estes receberam reconhecimento ou elogios por suas realizações. Comportamentos arrogantes e insolentes caracterizam estes indivíduos. Eles freqüentemente exibem atitudes esnobes, desdenhosas ou condescendentes (Critério 9). Por exemplo, um indivíduo com este transtorno pode queixar-se da "estupidez" ou "babaquice" de um garçom desajeitado ou concluir um exame médico avaliando o clínico de modo condescendente.

Características e Transtornos Associados
A vulnerabilidade da auto-estima torna os indivíduos com Transtorno da Personalidade Narcisista muito sensíveis a "mágoas" por críticas ou derrotas. Embora possam não demonstrar abertamente, as críticas podem assolar esses indivíduos e levá-los a se sentirem humilhados, degradados e vazios. Sua reação pode ser de desdém, raiva ou contra-ataque afrontoso. Essas experiências freqüentemente levam a um retraimento social ou a uma aparência de humildade que pode mascarar e proteger a grandiosidade. As relações interpessoais [522]tipicamente são comprometidas pelos problemas resultantes do sentimento de intitulação, da necessidade de admiração e do relativo desrespeito à sensibilidade alheia. Embora a ambição e a confiança ufanista possam levar a altas realizações, o desempenho pode ser perturbado em virtude da intolerância a críticas ou derrotas. Às vezes o desempenho profissional pode ser muito baixo, refletindo uma relutância para assumir riscos em situações competitivas ou de outra espécie, nas quais a derrota é possível. Sentimentos persistentes de vergonha ou humilhação e a autocrítica pertinente podem estar associados com retraimento social, humor deprimido e Transtorno Depressivo Maior ou Distímico. Por outro lado, períodos persistentes de grandiosidade podem estar associados com um humor hipomaníaco. O Transtorno da Personalidade Narcisista também está associado com Anorexia Nervosa e Transtornos Relacionados a Substâncias (especialmente relacionados à cocaína). Os Transtornos da Personalidade Histriônica, Borderline, Anti-Social e Paranóide podem estar associados com o Transtorno da Personalidade Narcisista.

Características Específicas à Idade e ao Gênero
Os traços narcisistas podem ser particularmente comuns em adolescentes, não indicando, necessariamente, que o indivíduo terá um Transtorno da Personalidade Narcisista. Os indivíduos com Transtorno da Personalidade Narcisista podem ter dificuldades especiais no ajustamento ao início das limitações físicas e ocupacionais inerentes ao processo de envelhecimento. Os homens perfazem 50 a 75% dos indivíduos com o diagnóstico de Transtorno da Personalidade Narcisista.

Prevalência
As estimativas da prevalência do Transtorno da Personalidade Narcisista variam de 2 a 16% na população clínica e são de menos de 1% na população geral.

Diagnóstico Diferencial
Outros Transtornos da Personalidade podem ser confundidos com o Transtorno da Personalidade Narcisista, por terem certos aspectos em comum, de modo que é importante distinguir esses transtornos com base em seus aspectos característicos. Entretanto, se um indivíduo tem características de personalidade que satisfazem os critérios para um ou mais Transtornos da Personalidade além do Transtorno da Personalidade Narcisista, todos podem ser diagnosticados. O aspecto mais útil para a discriminação entre o Transtorno da Personalidade Narcisista e os Transtornos da Personalidade Histriônica, Anti-Social e Borderline, cujos estilos de interação são, respectivamente, sedutor, indiferente e carente, é a grandiosidade característica do Transtorno da Personalidade Narcisista. A relativa estabilidade da auto-imagem, além da relativa ausência de autodestrutividade, impulsividade e preocupações com abandono, também ajudam a distinguir o Transtorno da Personalidade Narcisista do Transtorno da Personalidade Borderline. O excessivo orgulho por realizações, uma relativa ausência de manifestações emocionais e um desdém pela sensibilidade alheia ajudam a distinguir o Transtorno da Personalidade Narcisista do Transtorno da Personalidade Histriônica. Embora os indivíduos com Transtornos da Personalidade Borderline, Histriônica e Narcisista possam exigir muita atenção, aqueles com Transtorno da Personalidade Narcisista precisam, especificamente, que esta atenção se manifeste como admiração. Os indivíduos com Transtorno da Personalidade Anti-Social e Transtorno da Personalidade Narcisista compartilham uma tendência a serem insensíveis, superficiais, exploradores e não-empáticos. Entretanto, o Transtorno da Personalidade Narcisista não inclui, necessariamente, características de impulsividade, agressão e engodo. Além disso, os indivíduos com Transtorno da Personalidade Anti-Social podem não necessitar tanto da admiração e inveja dos outros, e as pessoas com Transtorno da Personalidade Narcisista em geral não possuem uma história de Transtorno da Conduta na infância ou comportamento criminoso na idade adulta. Tanto no Transtorno da Personalidade Narcisista quanto no Transtorno da Personalidade Obsessivo-Compulsiva, os indivíduos podem professar um compromisso com o perfeccionismo e acreditar que os outros não conseguem fazer as coisas tão bem quanto eles. Em contraste com a autocrítica que acompanha os indivíduos com Transtorno da Personalidade Obsessivo-Compulsiva, os indivíduos com Transtorno da Personalidade Narcisista estão mais propensos a crer que atingiram a perfeição. Desconfianças e retraimento social geralmente distinguem os indivíduos com Transtorno da Personalidade Esquizotípica ou Paranóide daqueles com Transtorno da Personalidade Narcisista. Quando essas qualidades estão presentes em indivíduos com Transtorno da Personalidade Narcisista, elas originam-se principalmente do medo de que sejam reveladas suas falhas ou imperfeições. A grandiosidade pode emergir como parte de Episódios Maníacos ou Hipomaníacos, mas a associação com uma alteração do humor ou prejuízos funcionais ajuda a fazer a distinção entre esses episódios e o Transtorno da Personalidade Narcisista. O Transtorno da Personalidade Narcisista deve ser diferenciado de uma Alteração da Personalidade Devido a uma Condição Médica Geral, na qual os traços emergem devido aos efeitos diretos de uma condição médica geral sobre o sistema nervoso central. Ele também deve ser diferenciado de sintomas que podem desenvolver-se em associação com o uso crônico de substâncias (por ex., Transtorno Relacionado à Cocaína Sem Outra Especificação). Muitos indivíduos altamente bem-sucedidos exibem traços de personalidade que poderiam ser considerados narcisistas, porém estes traços somente constituem um Transtorno da Personalidade Narcisista quando são inflexíveis, mal-adaptativos e persistentes e causam prejuízo funcional significativo ou sofrimento subjetivo.






Critérios Diagnósticos para F60.8 - 301.81 Transtorno da Personalidade Narcisista



Um padrão invasivo de grandiosidade (em fantasia ou comportamento), necessidade de admiração e falta de empatia, que começa no início da idade adulta e está presente em uma variedade de contextos, indicado por pelo menos cinco dos seguintes critérios: (1) sentimento grandioso da própria importância (por ex., exagera realizações e talentos, espera ser reconhecido como superior sem realizações comensuráveis)
(2) preocupação com fantasias de ilimitado sucesso, poder, inteligência, beleza ou amor ideal
(3) crença de ser "especial" e único e de que somente pode ser compreendido ou deve associar-se a outras pessoas (ou instituições) especiais ou de condição elevada
(4) exigência de admiração excessiva
(5) sentimento de intitulação, ou seja, possui expectativas irracionais de receber um tratamento especialmente favorável ou obediência automática às suas expectativas
(6) é explorador em relacionamentos interpessoais, isto é, tira vantagem de outros para atingir seus próprios objetivos
(7) ausência de empatia: reluta em reconhecer ou identificar-se com os sentimentos e necessidades alheias
(8) freqüentemente sente inveja de outras pessoas ou acredita ser alvo da inveja alheia
(9) comportamentos e atitudes arrogantes e insolentes.

domingo, 10 de março de 2013

Meditação: o fim do conflito.






Eu penso, que um dos nossos maiores problemas na vida, deve ser certamente, saber que nossas mentes deterioram, declinam, assim que envelhecemos ou, deterioram mesmo quando somos bem jovens, sendo especialista em determinado campo, não estando totalmente conscientes de toda a nossa complexa área da vida.

Deve se um grande problema descobrir se é realmente possível parar com essa deterioração.

Para que a mente seja sempre fresca, jovem,  clara, decidida e, é realmente possível terminar com este declínio?
 Esta noite, se me permitem, eu gostaria de entrar nisso, porque para mim, meditação é libertar a mente do conhecido.
E a questão aqui surge: é realmente possível acabar com esse processo, dessa mente, desse cérebro, assim como da mente a entidade total, completa?
 E também é possível manter a psique, o corpo, extraordinariamente vivos, alertas, com energia, etc.?

Assim, isso me parece ser uma grande questão e, portanto, um grande desafio para descobrir. Agora, a investigação disto, não apenas verbalmente, mas não verbalmente, a investigação, o exame disto, é meditação.
Esta palavra, a própria palavra é tão mal empregada.
Existem tantos métodos de meditação, se entendemos um, entenderemos todos os sistemas e formas de meditação mas, a questão central, que iremos conversar juntos nesta noite é essa: se a mente pode reaver, rejuvenescer a si própria, se ele apode se tornar fresca, jovem e sem medo.
 O fato é que existe deterioração e se a pessoa olha para ela, e traduz essa deterioração, ou tenta transcendê-la, ou ir além dela, em termos de inclinação pessoal, temporal, etc., isso se torna um negócio muito ordinário.
Mas, se você observa, como você observaria uma árvore, um por do sol, a luz na água, os contornos de uma colina azul, apenas observar isso, apenas observar o processo do que realmente está acontecendo em cada um de nós, então, nós iremos juntos.
E, se você não pode fazer isso, haverá acúmulo e não seremos capazes de andar pela estrada juntos, porque estamos interessados na totalidade do processo do viver e esse processo total do viver, como se observa, está sempre criando uma imagem sobre nós mesmos e sobre os outros, imagem através da experiência, através do conflito e, estamos conscientes que existe uma imagem em cada um de nós?

Sobre nós mesmos e essa imagem começa a se formar, mais e mais forte, mais e mais cristalizada então, é o fim de tudo. Assim, a pessoa está consciente disso?
 E se a pessoa está consciente disso, quem é a entidade que está consciente da imagem?
 Você entende a questão?
A imagem é diferente do criador da imagem? Ou, o criar a imagem e a imagem são a mesma coisa?
 Porque, a menos que se entenda esse fator muito claramente, o que iremos investigar não estará claro.

Eu percebo que eu tenho uma imagem sobre mim mesmo, que eu sou isso ou aquilo, que eu sou um grande homem ou um homem insignificante. Meu nome é conhecido, desconhecido, você sabe, toda a estrutura verbal e não verbal sobre si mesmo, consciente ou escondida.
 E, eu percebo que a imagem existe. Se realmente eu fico atento, vigilante, sei que existe essa imagem se formando o tempo todo, e o observador que está atento a essa imagem sente-se diferente da imagem, isso é o que está acontecendo.
Espero que estejamos esclarecendo tudo isso!
 E, o observador então começa a dizer para si mesmo que esta imagem é o fator que produz deterioração, portanto, preciso destruir esta imagem a fim de atingir o resultado maior, tornar a mente jovem e fresca e tudo mais. E ele luta, explica, justifica, ou acrescenta, esforça-se para mudá-la para uma imagem melhor.
É muito importante entender que o esforço, a luta, em diferentes formas, tanto fisicamente, como psicologicamente, como competição, como lição, agressão, violência, ou um dos sentimentos acumulados, etc., é um dos fatores da deterioração.
Assim, quando a pessoa percebe que o observador é o criador da imagem, então todo o nosso processo de pensar passa por uma tremenda mudança.
E essa imagem é o conhecido.
Assim, enquanto o cérebro, enquanto a mente toda, na qual estão reunidos os cérebro e o corpo, a mente toda, funciona dentro do campo da imagem, que é o conhecido no qual a pessoa pode estar consciente ou não, neste campo se encontra o fator de deterioração. Certo?
Por favor, não aceite isso como uma ideia que você vai refletir quando você for para casa — você não irá refletir de qualquer jeito — mas aqui estamos fazendo isso, considerando a coisa juntos, portanto, você deve fazê-lo agora, não quando você vai para casa e diz: "Bem, eu tomei nota e entendi isso, eu refletirei sobre isso". Não tome nota porque isso não ajuda de forma alguma.

Assim, surge a questão: é possível esvaziar a mente do conhecido?  Você entende? Estou sendo claro?
A pessoa deve ter perguntado esta questão vagamente ou com um propósito, o que ela sofre, tem ansiedades, se é possível ir além; ou a pessoa tem várias indicaçõs sobre isso, agora estamos perguntando, estamos perguntado isso como uma questão que precisa ser respondida, como um desafio que precisa ser respondido.
E este desafio não é um desafio externo, mas um desafio interno, psicologicamente.
E vamos descobrir se é possível esvaziar a mente do conhecido; este esvaziar da mente é meditação.

E devemos entrar nesta questão da meditação, quero dizer, explicar isso um pouco.
Todo povo asiático, está condicionado por esta palavra. As ditas pessoas religiosas sérias estão  condicionadas por esta palavra, porque através da meditação elas esperam encontrar algo além da mera existência diária. E, para encontrar isso, eles tem vários sistemas, muito, muito sutis ou muito grosseiros como o "Zen" e também este chamado sistema meditativo, existe concentração, fixar a mente numa ideia  em um pensamento em si, etc., e também a várias formas de estimulação, forçar a si mesmo estimular o seu ego e isso é para expandir a consciência, mais e mais, através da vontade, do esforço, da concentração, através da determinação de forçar, forçar, forçar, e, ao estender dessa consciência espera-se chegar num estado diferente, ou a uma diluição diferente, ou atingir aquele ponto que a mente consciente não pode atingir.
Ou a pessoa toma muitas, muitas drogas, incluindo a última, o LSD, etc., que dá — por um momento — uma tremenda estimulação a todo sistema e, neste estado, experimenta-se coisas extraordinárias, coisas extraordinárias através de estimulação, através de concentração, através de disciplina, através de passar fome, jejuar.
Se a pessoa jejua por alguns dias ela tem obviamente coisas peculiares que lhe acontecem e a pessoa toma drogas e isso lhe dá num momento, torna o corpo extraordinariamente sensível, e você vê cores das mais extraordinárias que você nunca tinha visto antes.
Você vê tudo tão claramente que não existe espaço entre você e essa coisa que você vê. Isso acontece em várias formas por todo o mundo. A repetição das palavras, como fazem os católicos, essas orações tolas que tornam a mente um pouco calma, quieta, obviamente é um truque.
Se você fica repetindo, repetindo, repetindo, você se torna tão embotado que obviamente você vai dormir e você pensa que isso é uma mente muito quieta. Mas, isso não é meditação. Assim, a pessoa põe de lado tudo isso, mesmo que estejamos comprometidos com isso, podemos jogar pela janela tudo isso.
E, enquanto você está escutando, espero que você vá jogar isso fora, porque vamos entrar em algo bem mais profundo que essa invenções.
Podemos colocar isso tudo de lado, porque, quanto mais se pratica uma disciplina mais a mente se torna embotada, mecânica, e esse processo mecanizante, rotineiro, torna a mente de alguma forma quieta, mas não é a quietude de uma tremenda energia, entendimento.
 Então, podemos continuar a investigar se é realmente possível libertar a mente do conhecido, não apenas o conhecido de mil anos, mas também o de ontem, que é a memória, o que não significa que eu esqueço o caminho para casa onde moro, ou a tecnologia. Isso obviamente a pessoa deve ter, isso é essencial, se não nós não podemos viver.
Estamos falando de coisas a um nível mais profundo, o nível profundo onde a imagem está sempre ativa. A imagem, que é o conhecido está funcionando o tempo todo e se essa imagem e o criador da imagem — que é o observador — se é possível esvaziar a mente disso e, o esvaziar do conhecido é meditação.
Eu só posso entender você quando eu não tenho nenhuma imagem sobre você. Mas, se a nossa é uma relação amigável, ou marido e mulher e tudo mais, temos uma imagem, e a imagem que eu tenho e que você tem sobre mim, estas imagens tem relacionamento e todo nosso relacionamento é baseado nisso.
A pessoa vê muito claramente que somente quando a imagem não interfere, — imagem como conhecimento, pensamento, emoção, etc. — não interfere, é que eu posso olhar, ouvir, entender.
Isso acontece com todos nós, quando de repente, você discute, argumenta, mostra, etc., de repente, sua mente se torna quieta e você vê, você diz: "Por Deus! Eu entendi!"

 Este entendimento é uma ação, não é uma ideia, certo?

Assim, existe entendimento, ação, só que ação num sentido diferente da ação que nós conhecemos, que é a ação da imagem, do conhecido.
Estamos falando de um entendimento que é uma ação quando a mente está quieta completamente. Nela, o entendimento, como ação, acontece. Assim, existe entendimento e ação, apenas quando a mente está completamente quieta — e essa mente nova, quieta não é induzida por qualquer disciplina, por qualquer esforço — e a meditação então é, a que a pessoa pode fazer quando está sentada num ônibus ou andando pela rua, lavando louça, ou sabe Deus o que mais.
E meditação não tem nada a ver com respiração e tudo isso.
Não há nada misterioso sobre isso; o mistério da vida está além de tudo isso, além da imagem, além do esforço, além da atividade centralizada, egocêntrica, subjetiva, auto-centrada.
 Existe um vasto campo de algo que nunca pode ser encontrado através do conhecido. E o esvaziar da mente só pode acontecer, não verbalmente, só quando não existe observador e o observado.
Tudo isso exige uma tremenda atenção, percepção, uma percepção que não é concentração, apenas observar sem escolher, quero dizer,escolha acontece apenas quando existe confusão, não quando existe claridade.
Assim, a percepção acontece apenas quando não existe escolha ou quando você está consciente de todas as escolhas conflitantes, desejos conflitantes, as tensões, apenas observar todo esse movimento de contradições e sabendo que o observador é o observado e, portanto, nesse processo, não existe escolha nenhuma, mas apenas observar o que é.
 E isso é inteiramente diferente de concentração.
E essa observação traz uma qualidade de atenção na qual não existe nem o observador e nem o observado e este esvaziar da mente, com todas as experiências, que ela teve, é meditação.
E só pode ser esvaziado todas as experiências quando cada experiência, a pessoa se torna consciente dela, vê todo conteúdo dela, sem escolha e, portanto, ela passa, portanto não existe marca dessa experiência, como uma ferida, como algo a recordar, para reconhecer e guardar.
Assim, a meditação é um processo muito árduo, não é apenas, uma coisa a ser feita por velhas senhoras ou homens que não tem nada para fazer. Isso exige uma tremenda atenção o tempo todo.
Então, você descobrirá, por você mesmo, — não, não é uma questão de experiência, não existe o contar — então, quando a mente está completamente quieta, sem qualquer forma de sugestão, como o hipnotismo, ou seguir um método, quando a mente está completamente quieta, então existe uma qualidade, uma dimensão diferente, que o pensamento não tem possibilidade de imaginar ou experimentar.

 Então a pessoa está além de toda busca, porque não existe procura — uma mente mente que está cheia de luz não procura — é só a mente, a mente embotada, confusa, que está sempre procurando, esperando encontrar.

O que ela encontra é o resultado de sua própria confusão.

Veja por favor, se você entende uma questão, você entendeu todas as questões.
E assim, o que é importante nisso tudo, não perguntar questões, ou respostas, ou as explicações, é que as explicações não tem valor algum. O que tem valor é como você pergunta a questão e o que você está esperando desta questão.
Se você está atento ao que você está perguntando, você verá está questão sem nenhuma dificuldade, portanto, não existe professor algum.
Você mesmo é tudo — tanto o professor, o aluno — você sabe, tudo. Isso lhe dá uma liberdade tremenda para investigar.

Krishnamurti - Palestra nº 4 - da primeira série intitulada "Revolução Real", realizada em 1966,  palestras em que, pela primeira vez, Krishnamurti permitiu ser filmado.

segunda-feira, 4 de março de 2013

A estrutura da violência

 
Às vésperas do dia internacional da mulher, o Banco Mundial, sob a coordenação da querida amiga, Paula Teklenburg, lança a campanha contra a violência às mulheres, com a participação de diversos artistas em que porta um cartaz com os dizeres: "Homem de verdade não bate em mulher"

É preciso, contudo, ir mais fundo na questão da violência que faz vítimas não somente as mulheres mas ao ser humano indinstintamente.



Há séculos que a humanidade convive com este flagelo sem que pudesse resolvê-lo e continua sem nenhum vislumbre para a sua solução. Claro que não temos a mínima pretensão de propor qualquer solução para este complexo problema milenar, mas podemos abordá-lo de alguma forma e examinar a possibilidade de nos vermos livres da violência, mas para isso precisamos conhecê-la intimamente, como disse Krishnamurti.

Somos violentos. Isto é fato irrefutável

A violência parece integrar nossa estrutura como bem ilustrado por Stanley Kubrik na famosa cena do osso em 2001.

O que é a violência, como ela surge?

Violência é ação derivada de um fato. O fato, o conflito. Voltando à cena do filme 2001, a existência de um conflito desenvolvido no decorrer de algum tempo disparou uma série de ações realimentadas em si mesmas, eclodindo em alguma coisa espetacular, desordenada e irracional, como uma reação em cadeia. Tal parece ser o “pattern” da violência.

Sem dúvida, uma herança animal, que é admitida com requinte e variações no meio humano que passa a contar com outro tipo de violência, a psicológica, que sabemos ser a mesma coisa por seguir o mesmo “pattern”, a existência do conflito, o tempo psicológico, que é o pensamento, e as ações concatenadas e exteriorizadas pelos insultos.

A ação isolada não existe. A chamada violência gratuita tem origem em conflitos psicológicos e podem  redundar em agressões nos dois níveis, do verbal para o físico ou até tudo junto verbal ao mesmo tempo que físico.

Apanhar enquanto leva um sermão não é raro até mesmo nos dias de hoje.

Os conflitos proveem das mais variadas divisões a que se submeteu a humanidade nos dias de hoje, tanto físicas quanto ideológicas, nem todos descambam para a violência, ou nem todos, melhor dizendo, são terrenos férteis para o desenvolvimento da violência ou são resolvidos à tempo.

Apenas para abreviar, nos interessa, no momento, a causa pela qual, certos conflitos permanecem insolúveis por um período suficiente para o desenvolvimento da violência e como ela se desenvolve. Para melhor entendimento, conta-se a história de uma menina de 6 ou 7 anos que era obrigada, todos os dias, a comer alguma coisa de que não gostava. A certo momento ela passou a comer somente o que gostava e o resto passou a descartar atrás da geladeira. Passado algum tempo, como era de se esperar a trama foi descoberta e a menina levou uma surra.

O conflito derivado no “forçar” a criança a comer o que não gostava levou-a a uma ação equivocada que ao invés de solucionar o conflito, deu-o força. A ação, inocente para ela, foi uma ação eivada do germe da violência. Certamente, impulsionada pelo medo, a pobre garota fugiu à resolução do conflito e, incompreendida, colheu a violência.

Até o momento conseguimos relacionar a violência com o conflito, o tempo e o medo.

Por que sentimos medo, o que é o medo?

E a jornada prossegue...


Por J. Krishnamurti

O medo, o prazer, o sofrimento, o pensamento e a violência estão relacionados entre si. Em maioria encontramos prazer na violência, em não gostar de alguém, em odiar uma dada raça ou grupo de pessoas, em nutrir sentimentos hostis para com os outros. Mas, no estado mental em que a violência desapareceu completamente, há uma alegria muito diferente do prazer da violência, com os seus conflitos, rancores e temores.

Podemos penetrar a raiz da violência e dela nos livrarmos? De contrário, viveremos a batalhar perenemente uns com os outros. Se é dessa maneira que desejais viver - e aparentemente a maioria das pessoas o deseja - continuai então assim; se dizeis: "Ora, sinto muito, mas a violência nunca terá fim, jamais acabará" - nesse caso vós e eu não temos possibilidade de comungar, uma vez que vos emparedastes; mas se dizeis que talvez exista uma diferente maneira de viver, teremos então a possibilidade de comunhão.

Consideremos, pois, juntos - aqueles de nós que têm a capacidade de comungar - se existe alguma possibilidade de acabarmos totalmente com qualquer forma de violência em nós mesmo existente, e ao mesmo tempo vivermos neste mundo monstruoso e brutal. Acho que é possível. Não desejo ter em mim a mais leve sombra de ódio, de ciúme, de ansiedade ou medo. Desejo viver completamente em paz. Mas isso não significa que desejo morrer. Desejo viver nesta terra maravilhosa, tão cheia de vida, de riqueza e de beleza! Desejo olhar as árvores, as flores, os rios, os prados, as mulheres, as crianças, e ao mesmo tempo viver completamente em paz comigo mesmo e com o mundo. Que posso fazer?

Se soubermos olhar a violência, não só exteriormente, na sociedade - guerras, rebeliões, antagonismos nacionais e conflitos de classes - mas também em nós mesmos, talvez então tenhamos a possibilidade de transcendê-la.

Este é um problema muito complexo. Há séculos e séculos que o homem é violento; as religiões, em todo o mundo, tentaram amansá-lo, e nenhuma delas foi bem-sucedida. Assim, se vamos examinar esta questão, devemos, acho eu, encará-la com toda a seriedade, porque esse exame nos levará a um domínio completamente diferente. Mas se desejamos meramente entreter-nos intelectualmente com o problema, não iremos muito longe.

Podeis pensar que de vossa parte esse problema vos interessa seriamente, mas, uma vez que há tanta gente no mundo que não o leva a sério e não se mostra disposta a tomar alguma medida em relação a ele, de que serve fazerdes alguma coisa? Não me importa se os outros o levam a sério ou não; eu o levo a sério, e tanto basta. Eu não sou o guarda de meu irmão (1). Eu, de minha parte, como ente humano, sinto-me fortemente interessado nesta questão da violência, e farei o necessário para eu próprio não ser violento; mas não posso dizer a vós nem a ninguém: "Não sejais violento". Isso não tem significação alguma, a não ser que também não desejeis sê-lo. Assim, se pessoalmente desejais compreender o problema da violência, prossigamos juntos a nossa viagem de exploração.

O problema da violência é exterior ou interior? Desejais resolver o problema no mundo exterior, ou estais questionando a violência em si, tal como em vós existe? Se, interiormente, em vós mesmos, estais livre da violência, surge logo a pergunta: "Como posso viver num mundo cheio de violência, ganância, avidez, inveja, brutalidade? Não serei destruído?" - Esta alusão às palavras de Caim, após assassinar Abel, é a pergunta que inevitável e invariavelmente se faz. Fazendo tal pergunta, não me pareceis estar vivendo realmente em paz. Se viveis pacificamente, não tendes problema de espécie alguma. Podeis ir para a prisão se vos recusardes a alistar-vos no exército, ou ser fuzilado se vos recusardes a combater; mas isso não é problema: sereis fuzilado. É extremamente importante compreender isso.

Estamos tentando compreender a violência como um fato, não como uma idéia; como um fato existente no ente humano, e o ente humano sou eu. E, para examinar o problema, eu tenho de ser completamente vulnerável, aberto a ele. Tenho de desmascarar-me a mim mesmo; não há necessidade de me desmascarar diante de vós, porque isso talvez não vos interesse - mas devo achar-me num estado mental que queira levar o exame completamente a cabo, sem me deter em nenhum ponto, dizendo "não irei mais adiante".

Ora, devo ver bem claramente que sou um ente humano violento. Tenho experimentado a violência na cólera, nos apetites sexuais, no ódio, no criar inimizades, no ciúme etc. Tendo-a experimentado, conhecido, digo de mim para mim: "Desejo compreender este problema integralmente, e não apenas um fragmento seu, conforme se expressa na guerra; quero compreender essa agressividade existente no homem e que também existe nos animais, dos quais faço parte".

Violência não é meramente assassinar. Há violência no uso de uma palavra áspera, num gesto de desprezo, na obediência motivada pelo medo. A violência, portanto, não é apenas a carnificina organizada, em nome de Deus, da sociedade, da pátria. A violência é muito mais sutil e profunda, e nós queremos investigar as suas últimas profundezas.

Quando vos denominais indiano, ou maometano, ou cristão, ou europeu, ou o que quer que seja, estais sendo violento. Sabeis por quê? Porque vos estais separando do resto da humanidade. Quando vos separais, pela crença, pela nacionalidade, pela tradição, gera-se a violência. Assim, o homem que deseja compreender a violência, não deve pertencer a nenhuma nação, nenhuma religião, nenhum partido político ou sistema partidário; o que deve interessá-lo é a compreensão total da humanidade.
Pois bem; há duas escolas principais de pensamento que se interessam pela violência. Uma delas diz: "A violência é inata no homem"; a outra diz: "A violência é o resultado da herança social e cultural do homem". Não nos interessa a escola a que pertenceis, pois isso não tem importância nenhuma. O importante é o fato de que somos violentos e não a razão desse fato.

Uma das expressões da violência mais comuns é a cólera. Quando atacam minha esposa ou minha irmã, sinto-me justamente encolerizado; quando são atacados a minha pátria, as minhas idéias, os meus princípios, a minha maneira de vida, fico também justamente encolerizado. Sinto também cólera, quando são atacados os meus hábitos, as minhas insignificantes opiniões. Se me pisais no pé ou me insultais, enraiveço-me, ou se fugis com minha mulher sinto ciúme, um ciúme também justo, porque ela é minha propriedade. Todas essas manifestações de cólera são moralmente justificadas. Também se justifica o matar pela pátria. Assim, falando a respeito da cólera, que faz parte da violência, consideramo-la em termos de cólera justa e cólera injusta, conforme nossas próprias inclinações ou as pressões do ambiente ou a consideramos como cólera simplesmente? Existe cólera justa? Ou só existe a cólera? Não há influência boa ou influência má - só há influência; mas quando sou influenciado por uma coisa que não me convém, chamo-lhe má influência.

Se protegeis vossa família, vossa pátria, um trapo colorido chamado bandeira, uma crença, uma idéia, um dogma, aquilo que quereis possuir ou que já tendes nas mãos, essa própria proteção denota cólera. Assim, podeis olhar a cólera sem nenhuma explicação ou justificação, sem dizerdes: "Tenho de proteger o que é meu" ou "Tive razão para me encolerizar" ou "Que estupidez minha, ter-me encolerizado"? Podeis olhar a cólera como uma coisa em si? Podeis olhá-la de maneira completamente nova, quer dizer, sem defendê-la, nem condenada? Podeis?

Posso olhar-vos se vos sou hostil ou se vos considero uma pessoa excelente? Só posso ver-vos, quando vos olho com certo cuidado em que não esteja contida nenhuma dessas coisas.
Ora, posso eu olhar a cólera da mesma maneira, o que significa que sou vulnerável ao problema, que não resisto a ele, que estou observando, que estou observando esse extraordinário fenômeno sem nenhuma reação a ele?

É muito difícil considerar a cólera desapaixonadamente, porquanto ela faz parte de mim, mas é isso o que estou tentando fazer. Aqui estou eu, um ente humano violento, não importando se sou preto, se sou moreno, branco ou vermelho. Não importa se herdei essa violência ou se a sociedade a produziu. Só isto me importa: "Se é possível libertar-me dela". Livrar-me da violência significa tudo para mim. É-me mais importante do que o sexo, o alimento, a posição, porque essa coisa me está corrompendo. Estou a destruir-me e a destruir o mundo, e preciso compreender a violência, transcendê-la. Sinto-me responsável por toda a cólera e toda a violência existentes no mundo. Sinto-me responsável, e isso não são meras palavras. Digo de mim para comigo: "Só posso fazer alguma coisa se eu próprio transcender a cólera, a violência, a nacionalidade". E esse meu sentimento de que devo compreender a violência em mim existente me confere uma estupenda vitalidade e paixão para compreendê-la.
Mas, para transcender a violência, não posso reprimi-la, negá-la, não posso dizer: "Ora, ela faz parte de mim, e está acabado" ou "Eu não a quero". Tenho de enfrentá-la, de estudá-la, de entrar em intimidade com ela, e essa intimidade não é possível se a condeno ou justifico. Entretanto, na verdade, nós a condenamos e justificamos. Por conseguinte, digo "Deixemos, por ora, de condená-la ou de justificá-la".

Ora bem, se desejais acabar com a violência, acabar com as guerras, quanta vitalidade, quanto de vós mesmo aplicais a isso? Não vos importa que vossos filhos pequenos sejam mortos, que vossos filhos mais velhos se alistem no exército para serem maltratados e abatidos como reses? Não vos importa isso? Deus meu! Se isso não vos importa, o que mais vos importa? Conservar vosso dinheiro? Gozar a vida? Tomar drogas? Não percebeis que a violência em vós existente está destruindo os vossos filhos? Ou a vedes apenas como uma espécie de abstração?

Bem; se tendes interesse nisso, aplicai-vos de corpo e alma a compreendê-lo. Não vos recosteis na cadeira, dizendo: "Está bem; conta-nos toda a história". Preciso fazer-vos ver que não se pode olhar a cólera nem a violência com olhos que condenam ou justificam, e que, se a violência não representa para vós um urgente problema, não podeis afastar aquelas duas coisas. Assim, em primeiro lugar, tendes de aprender; tendes de aprender a olhar a cólera, a olhar vosso marido, vossa esposa, vossos filhos: tendes de escutar o político, aprender porque não sois objetivo, porque condenais ou justificais. Tendes de aprender que condenais e justificais porque isso faz parte da estrutura social em que viveis,- faz parte de vosso condicionamento como alemão, indiano, negro, americano - ou o que acaso sois por nascimento - com todo o embota-mento mental resultante desse condicionamento. Para aprender, para descobrir uma coisa fundamental, precisais de penetração. Se tendes um instrumento obtuso, um instrumento embotado, não podeis penetrar profundamente. Assim, o que agora estamos fazendo é aguçando o instrumento, que é a mente - essa mente que se embotou por causa do justificar e do condenar. Só sereis capaz de penetrar fundo se vossa mente for penetrante como uma agulha e forte como o aço.

De nada serve ficardes recostado e perguntar: "Como chegarei a ter essa mente?". Vós tendes de desejá-la assim como desejais a vossa próxima refeição, e para a terdes deveis ver que o que está tornando vossa mente embotada e estúpida é esse estado de invulnerabilidade que ergueu muralhas ao redor dela e que faz parte da condenação e da justificação. Se a mente puder libertar-se desse estado, sereis então capaz de olhar, de estudar, de penetrar e, assim, talvez, alcançar um estado totalmente consciente do problema em seu todo.

Voltemos, pois, ao problema central: É possível erradicarmos a violência em nós existente? É uma forma de violência dizer: "Não mudaste! Por que não mudaste?" -- Não é isso que estou fazendo. Para mim, nada significa convencer-vos de uma coisa. Trata-se de vossa vida, e não da minha vida. Vossa maneira de viver é da vossa própria conta. O que pergunto é se é possível a um ente humano que psicologicamente vive em não importa que sociedade, se é possível a esse ente humano libertar-se interiormente da violência. Se é possível, esse mesmo processo criará uma nova maneira de viver neste mundo.

A maioria aceita a violência como maneira de vida. Duas guerras medonhas nada nos ensinaram a não ser a levantar mais e mais barreiras entre os seres humanos - entre vós e mim. Mas, quanto àqueles que desejam libertar-se da violência, que se deve fazer? Penso que nada se conseguirá por meio da análise, feita por vós mesmo ou por um profissional. Poderíamos, talvez, modificar-nos ligeiramente, viver um pouco mais sossegadamente, com um pouco mais de afeição, mas isso, por si só, não nos dará a percepção total. Mas eu preciso saber analisar, pois, no processo da análise a mente se torna sobremodo penetrante e é essa capacidade de penetração, de atenção, de seriedade, que dará a percepção total. Ninguém tem olhos capazes de ver o todo num relance; essa clarividência só é possível se podemos ver os detalhes e, depois, saltar.

Alguns dentre nós, a fim de se libertarem da violência, têm-se servido de um conceito, de um ideal chamado "não violência", e pensamos que, tendo um ideal que seja o oposto da violência - a não violência - podemos libertar-nos do fato, da coisa real; mas não podemos. Temos tido inumeráveis ideais, todos os livros sagrados estão cheios deles e, contudo, continuamos violentos; portanto, por que não enfrentar a própria violência e esquecer de todo a palavra?

Se desejais compreender a realidade, a isso deveis aplicar toda a vossa energia. Essa atenção e energia são desviadas quando se cria um mundo fictício, ideal. Assim, podeis banir completamente o ideal? O homem que é realmente sério, que sente a ânsia de descobrir o que é a verdade, o que é o amor, não tem conceito de espécie alguma. Só vive dentro de o que é.

Para investigar o fato de vossa própria cólera, não deveis pronunciar julgamento sobre ela, porque no mesmo instante em que concebeis o seu oposto, a estais condenando e, por conseguinte, não podeis vê-la tal como é. Quando dizeis que não gostais ou que tendes ódio de alguém, isso é um fato, embora pareça terrível. Se o olhais, se o examinais cabalmente, ele deixa de existir; mas se disserdes "Eu não devo odiar; devo ter amor no coração", ficais então vivendo num mundo hipócrita, de duplos padrões. Viver com plenitude no momento presente é viver com o que é, o real, sem idéia de condenação ou justificação; então o compreendeis tão completamente que ficais livre dele. Quando se vê claramente, o problema está resolvido.

Mas, podeis ver claramente a face da violência, não só fora mas também dentro de vós, o que significa que estais totalmente livre da violência, uma vez que não aceitastes nenhuma ideologia para, por meio dela, vos libertardes da violência? Isso exige meditação muito profunda, e não uma simples concordância ou discordância verbal.

Acabastes de ler uma série de asserções, mas tereis compreendido tudo? Vossa mente condicionada, vossa maneira de vida, a inteira estrutura da sociedade em que viveis, vos impedem de olhar um fato e dele vos livrardes imediatamente. Dizeis: "Vou pensar a respeito disso; vou considerar se é ou não possível libertar-me da violência. Vou tentar ser livre". Esta é uma das coisas mais terríveis que se podem dizer: Vou tentar. Não há tentar, não há esforçar-se. Ou a gente age ou não age. Estais admitindo o tempo, com a casa em chamas. A casa está a arder, como resultado da violência existente no mundo inteiro e em vós mesmo, e dizeis "Vou pensar nisso. Qual é a melhor ideologia para extinguir o fogo?

" Quando a casa está em chamas, discutis sobre a cor dos cabelos do homem que traz a água?
Textos de J.Krishnamurti em Português

segunda-feira, 5 de novembro de 2012