quinta-feira, 20 de março de 2008

A Abertura dos Portos (ou das pernas)


Manchetes do dia

“As ações de empresas ligadas à exportação de commodities voltaram a operar em terreno negativo nesta quinta-feira, e carregam consigo a Bovespa.”

Ou

“A Bovespa (Bolsa de Valores de São Paulo) abriu nesta quinta-feira em baixa, ainda refletindo o mau humor de ontem causado pela queda generalizada dos preços das commodities metálicas e agrícolas --em especial do petróleo e do minério de ferro.”

E ainda

“Assustados com os problemas no sistema financeiro americano, os investidores estrangeiros tiraram R$ 2,109 bilhões da Bolsa de Valores de São Paulo”

Embora a moeda estrangeira tenha tido uma pequena recuperação com o vôo de dois bilhões de dólares, a situação do setor exportador nacional se complica de vez. O que fazemos agora, no final das contas, é tomar dinheiro a 11,25% e emprestar a 2,25%, com o prejuízo sendo pago com nossas riquezas, um dos piores negócios desde 1703.

Sob o título sugestivo “ A Penetração Britânica no Brasil” achei a matéria abaixo como resultado da minha busca dos piores negócios até hoje envolvendo o nome tupiniquim:

O mais importante tratado, pelo seu caráter lesivo a Portugal, foi o de Methuen, assinado em 1703, em pleno início da mineração no Brasil. O tratado possuía apenas dois artigos:


Artigo 1º. Sua Sagrada Majestade El Rei de Portugal promete, tanto em seu próprio Nome, como no de Seus Sucessores, admitir para sempre de aqui em diante, no Reino de Portugal, os panos de lã e mais fábricas de lanifício de Inglaterra, como era costume até o tempo em que foram proibidas pelas leis, não obstante qualquer condição em contrário.


Artigo 2º. E estipulado que Sua Sagrada e Real Majestade Britânica, em Seu Próprio Nome, e no de Seus Sucessores, será obrigada para sempre, de aqui em diante, de admitir na Grã Bretanha os vinhos do produto de Portugal, de sorte que em tempo algum (haja paz ou guerra entre os Reinos de Inglaterra e de França) não se poderá exigir direitos de Alfândega nestes vinhos, ou debaixo de qualquer outro título direta ou indiretamente, ou sejam transportados para Inglaterra em pipas, tonéis ou qualquer outra vasilha que seja, mais que o que se costuma pedir para igual quantidade ou medida de vinho de França, diminuindo ou abatendo terça parte do direito de costume.


Continua a matéria

“Tratado de Methuen estipulou, em síntese, a compra do vinho português em troca de tecidos ingleses. Esse acordo bastante simples foi, entretanto, altamente nocivo para Portugal porque, em primeiro lugar, importava-se mais tecido do que se exportava vinho, tanto em termos de quantidade como em valor;

em segundo, as manufaturas portuguesas foram eliminadas pela concorrência inglesa.

Por último, dado o desequilíbrio do comércio com a Inglaterra, a diferença foi paga pelo ouro brasileiro.

Desse modo, o Tratado de Methuen abriu um importante canal para a transferência da riqueza produzida no Brasil para a Inglaterra.”

Cerca de cem anos mais tarde, a coisa ao invés de melhorar foi piorando, quando chegamos por volta de 1810, época da abertura dos portos:

“Com tempo, a dependência de Portugal se aprofundou e essa foi a razão por que D. João finalmente se submeteu às exigências inglesas e se transferiu para o Brasil.

Em 1810, quando a Corte já se encontrava no Rio de Janeiro, a Inglaterra fez D. João assinar três tratados que a favorecia.

Um deles era o de Amizade e Aliança o outro de Comércio e Navegação e um último que veio regulamentar as relações postais entre os dois reinos.

Do conjunto dos dispositivos, destacavam­-se alguns artigos que feriam frontalmente os interesses econômicos de Portugal e do Brasil, além da humilhação política que outros itens impuseram à soberania lusitana.”

“Outro aspecto escandaloso dos tratados foi o direito assegurado à Inglaterra de colocar suas mercadorias no Brasil mediante a taxa de 15% ad valorem, enquanto os produtos portugueses pagavam 16%, isto é, 1 % a mais que os ingleses!

Os demais países estavam submetidos à taxação de 24% em nossas alfândegas.”

A abertura dos portos alterou profundamente os hábitos de consumo no Brasil, com a chegada de grande quantidade de mercadorias, sobretudo de origem inglesa.

Um viajante inglês, John Mawe, assim descreveu o Rio dessa época:


"O mercado ficou inteiramente abarrotado; tão grande e inesperado foi o fluxo de manufaturas inglesas no Rio, logo em seguida à chegada do Príncipe Regente, que os aluguéis das casas para armazená-las elevaram-se vertiginosamente. A baía estava coalhada de navios, e em breve a alfândega transbordou com o volume das mercadorias. Montes de ferragens e pregos, peixe salgado, montanhas de queijos, chapéus, caixas de vidro, cerâmica, cordoalha, cerveja engarrafada em barris, tintas, gomas, resinas, alcatrão etc., achavam se expostos não somente ao sol e á chuva, mas à depredação geral; (...) espartilhos, caixões mortuários, selas e mesmo patins para gelo abarrotavam o mercado, no qual não pode­riam ser vendidos e para o qual nunca deveriam ter sido enviados."

Como diz aquela canção, nada mudou.

Se eu tivesse o talento do desenho, eu faria a seguinte charge:

Um grande navio com a bandeira americana afundando, já se encontrando semi submerso como o Titanic. Uma pequena embarcação com a bandeira do Brasil nas proximidades recolhe grande quantidade de náufragos, cada um com seu cofrinho. Já pra lá de super-lotada, na verdade, começando adernar, o capitão Meireles manda o imediato Luis a jogar alguns tripulantes nacionais na água para abrir mais espaço....

terça-feira, 18 de março de 2008

A Nau dos Tolos


Considero a marca recorde do IBOVESPA um marco insólito.

Não que seja inexplicável.

No Titanic, quando este começou a afundar todos correram para a popa, mas acabaram afundando também, só que por último.

O sistema econômico mundial, a exemplo do Titanic, mostra sinais de que está fazendo água pela proa com a ameaça de estagflação da economia americana e inflação na China. Os investidores correm para as commodities no mercado futuro (dentre elas o petróleo) e para nichos de certa estabilidade, como se verifica hoje no Brasil, para salvaguarda de seus papeis.

O petróleo está a apenas US $ 99,99. Isto não quer dizer que esteja barato e que a desvalorização do dolar tenha provocado um aumento da demanda, como incrivelmente chegou a noticiar a Folha On Line em 27.02.2008.

Mesmo com toda a inflação americana o óleo está caríssimo.

Para a compreensão do que está hoje acontecendo no mundo, recorramos à teorização feita por André Sautou em seu artigo entitulado “The Smart Creature and the Nasty Trick” , publicado em frances em outubro de 2007 por Les Editions de l’Or Noir :


“The exchange mechanisms between the system’s components rest upon the existence of a financial bubble kept under pressure as long as expanding markets allow investors to make profits re-injected into the bubbleWhen the world economic growth reverses into decline, the bubble pressure will vanish, the exchange mechanisms will crumble down and the whole system will collapse”.


Ou seja, os mecanismos de troca entre os componentes do sistema têm como base a existência de uma bolha financeira mantida sob pressão ao tempo em que os mercados em expansão proporcionam lucros aos investidores que os reinjetam na bolha.

Quando ocorrer retração ao invés de crescimento, a pressão desaparecerá, os mecanismos de troca espatifarão e todo o sistema virá abaixo.

Bom lembrar que, como aconteceu no famoso naufrágio, não haverá bote para todos.

Com o oleo se aproximando dos US$ 104 por barril, outro marco é atingido.


É que no início de 1980, com a revolução iraniana, o petróleo atingiu US$ 38 por barril que, em valores atuais, daria alguma coisa entre $93 e $ 104, dependendo do critério utilizado para o cálculo da inflação no período.Com a queda da moeda americana, as commodities se tornaram um refúgio para o capital de grandes fundos de investimento, como opinou Nauman Barakat, do Macquaire Futures, a “trading” do banco de investimento Macquarie.


A tendência da moeda americana é de cair ainda mais com o corte na taxa básica de juros pelo Federal Reserve, esperada por todo o mercado cortes de até 2% ao longo dos próximos meses.Espera-se, ainda que em meados de maio a gasolina nos EUA cheguem a US$ 4 por galão (atualmente em US$ 3,15 + - )US 4 por galão representa aproximadamente R$ 1,78 por litro.


Vejam como é cara a gasolina brasileira.


No rastro de outra informação fantástica divulgada em 27/2 pela Folha, de que o Brasil poderá responder por até 6% da exportação de petróleo no mundo, pode ser que o IBOVESPA inche ainda mais.

Não tenho nada contra os otimistas e sonhadores, mas o trabalho, de autoria creditada ao Professor Adilson de Oliveira não tem consistência histórica.

Há quase dez anos que a Petrobrás “briga” com o campo “gigante” de Roncador, lamina d’água de 1.850 metros e até agora o que consegue retirar é cerca de 80.000 barris diários.

Daí dizer que pelo ano de 2025, o campo de Tupi, com lamina d’água de 3.000 metros produzirá algo como 4 milhões de barris diários é no mínimo assombroso.


Definitivamente inacreditável.


Mais fácil que, a exemplo da P-36, tudo vá para o fundo.

Os americanos mergulham nós corremos o risco de nos afogar em cachaça.


Já faz tempo que economia foi deposta do status de ciência, a não ser da ciência do chute, mas se examinarmos a história, esta dirá que atravessamos um momento peculiar.

Hoje, ao contrário de aproximadamente 25 anos atrás quando o preço do petróleo chegou aos níveis atuais, a nossa dependência do óleo importado era enorme e qualquer desestabilização da economia americana era desastrosa para a nossa.


Hoje a coisa mudou.


O país conseguiu estabilizar a moeda e gera aproximadamente a energia que consome.


Esta imagem de estabilidade vem sendo fortalecida no cenário internacional com o passar dos anos, atraindo o capital externo, que junto com a política de juros elevados, vem desembarcando aos turbilhões. Tanto que chegou a virar nossa posição de devedor para credor.

Ou seja, se antes estávamos como pedintes, hoje estamos quase que nos afogando.

Passamos de um extremo ao outro, em grande parte decorrente do mergulho da economia americana. A impressão que se tem é que alguém esqueceu a torneira aberta ou não tiraram a placa “Vende-se” e, por isso, continuam comprando o mesmo país várias e várias vezes.Economia, ciência ou não, é difícil.

E a vida ensina que quando não sabemos, melhor usar o bom senso, e o bom senso é permanecer longe de limites.
Por incrível que pareça, o Banco Central ainda cogitou, na última reunião do Copom, no aumento da taxa básica de juros.

A justificativa exposta foi que "um ajuste da taxa básica de juros contribuiria para reforçar a ancoragem das expectativas, não apenas para 2008, mas também no médio prazo, e para reduzir o descompasso entre as trajetórias da demanda e oferta agregadas", mas "que, neste momento, o balanço dos riscos para a trajetória prospectiva central da inflação justificaria a manutenção da taxa básica em seu patamar atual".


Neste economês ridículo, o que eles devem ter querido dizer, se é que eles queriam dizer alguma coisa, é que existe maior demanda que oferta(isto é lógico porque estão arrebentando nosso setor produtivo, já que todos os nossos produtos estão sendo substituídos por similares chineses muito mais baratos com a desvalorização cambial), mas que não achavam que a curva real iria se desviar muito da prevista. Enquanto isso o país aparece bem destacado, isolado na primeira colocação, dos juros mais exorbitantes do planeta, o paraíso para a prática da usura.Mas o assunto está longe de ser consenso mesmo dentro do próprio governo, a começar pelo Guido Mantega, declaradamente a favor da redução da taxa de juros. O ministro Miguel Jorge, comentando a ata da última reunião do Copom declarou: "Do ponto de vista do Ministério do Desenvolvimento, nós não corremos o risco de inflação de demanda. Acreditamos que a indústria é capaz de atender a demanda atual, portanto, não há risco de inflação" e continua "Com cenário macroeconômico estável, cenário externo confortável e crescimento sustentável, acho que há um certo exagero nesta colocação [na ata do Copom] dos meus amigos do Banco Central". Também o ministro Paulo Bernardo (Planejamento) reconheceu que as taxas de juros no país estão elevadas, mas disse que há chances de serem reduzidas.


"Nós temos condições de reduzir as taxas de juros. Estamos caminhando para isso", disse.


Como em ocasiões anteriores, entidades da indústria e do comércio criticaram a decisão. Enquanto a Firjan (Federação das Indústrias do Rio de Janeiro) defendeu a aprovação da reforma tributária como meio de retomar os cortes, a CNI argumentou que a "queda dos juros é crucial para reverter valorização do real".


Para o comércio, a manutenção da Selic é "inexplicável" e inibe o crescimento.


Talvez nem seja inexplicável como possa parecer, a Força Sindical em sua nota sugere uma explicação:

"Os trabalhadores estão indignados e decepcionados com a decisão do Copom. Os integrantes do Banco Central beijam as mãos dos especuladores e viram as costas para os trabalhadores".


Mas deveria ser diferente?

O Copom justificaria um eventual aumento da taxa de juros para "reduzir o descompasso entre as trajetórias da demanda e oferta agregadas", como está exposto na ata.


Deduz-se, diante do quadro, que o referido "descompasso" diz respeito a demanda maior que a oferta. Ora, todo o mundo sabe que maior pressão de demanda provoca aumento dos preços.


Mas o acerto não necessita ser feito pelo lado da demanda, inibindo-a via aumento da taxa de juros, mas como pode ser feita, também, pelo lado da oferta estimulando a produção via diminuição da taxa de juros.

Uma corrente significativa entre os estudiosos é que o atual patamar praticado pelo Brasil é tão elevado que se encontra em território "neutro" como mecanismo regulador ( a curva é assíntota aos eixos, significando que acima de determinado valor pouco efeito decorre de sua variação, como tambem abaixo de um valor mínimo).

No início de 80 os EUA praticaram uma taxa de juros próximo ao nosso patamar atual, rapidamente os baixaram (creio que não chegou a durar tres anos) , por constatar, creio, seu parco efeito.
Por outro lado, o Brasil vem utilizando altas taxas de juros com o intuito de atrair investimentos estrangeiros. O valor foi fixado na estratosfera, mas devido a instabilidade econômica do país, poucos investidores se predispunham ao risco ( quando sinaliza altas taxas tambem se sinaliza altos riscos).

A situação hoje é outra.

O Brasil tem energia e está estável, sendo assunto nos períodicos internacionais com certa frequencia ultimamente.

Tal situação aliada ás taxas de juros vem turbinando de forma impressionante a entrada de dinheiro estrangeiro no país. Dentro dos fundamentos, a maior oferta da moeda estrangeira tem jogado a taxa de cambio para baixo, valorizando o real.

Se as autoridades econômicas não agirem com o intuito de procurar o novo equilíbrio desejável ( o governo tomou algumas medidas, mas que ainda não chegaram a animar os analistas), o nosso setor produtivo destinado a exportação (exceto commodities) entrará em colapso dentro de alguns meses, seguido pelo setor produtivo interno pela invasão de produtos importados a preços irrisórios.


Os preços da commodities já sofreram reajuste devendo ser estudadas à parte.