quinta-feira, 26 de março de 2009

GRITO DA TERRA


Imaginem que a humanidade, em um processo individual, tenha se conscientizado de repente da inutilidade de grande parte dos produtos que consome.
Imaginem, só por um momento, que pessoas, em número crescente, começassem a controlar o peso e baixar a taxa de colesterol, e por causa disso, abolissem as carnes de seus cardápios diários.

Imaginem o que aconteceria, se os ricos ao invés de trocar de carro todo ano, trocassem de três em três anos, a classe média de cinco em cinco, e assim por diante, preocupadas, talvez, pela escalada dos preços dos combustíveis, pela poluição ou mesmo pela falta de espaço para mais um carro na garagem.

Talvez os paulistanos, em dado momento, se sintam furiosos em ter cinco carros na garagem, um para cada dia da semana, por causa de um trânsito cada vez mais intenso, e sem mais espaço para pontes e viadutos. E ainda, pagar IPVA integral de um veículo que só pode trafegar em determinados horários e em determinados dias da semana.

O que aconteceria com a economia?

Com menores vendas as indústrias automotivas entrariam em crise, e por efeito dominó, essa crise seria transmitida para a indústria de autopeças, para o aço e para a energia. Com menor procura pela carne, que é uma commodity, seu preço despencaria junto com aço, que é outra commodity.

Neste processo, as pessoas se mudariam para locais mais perto do trabalho, ou do metrô, haveria uma desvalorização de imóveis nas regiões suburbanas.
Haveria demissões pela indústria, queda de seus papeis nas bolsas de valores, e as famílias não mais podendo honrar seus compromissos, pela perda do emprego e vendaval em suas economias, levaria a crise ao sistema financeiro.
Não tem nada demais em imaginar que estas coisas poderiam acontecer, como aliás, de fato acontecem, só que se atribui a fatores outros e explicados por fórmulas matemáticas. Porém a crise é de consumo.

O mundo está consumindo menos, gastando menos energia, e isto é terrível. Terrível para quem?

A crise é de consumo e foi deflagrada pela nação mais rica e consumista do mundo.
Um povo que, se economizasse 10%, quase que daria para sustentar com o que deixou de gastar, o consumo de todo o nosso país.
A crise é, portanto, de consumo de bens de luxo, principalmente.
Toda uma série de produtos inúteis, supérfluos, que com eles os ricos não querem mais gastar, por se acharem menos ricos atualmente.

Compreensível.

No entanto, as indústrias de quinquilharias e bens de lixo não conseguem compreender este fato singelo, muito menos os governos que incharam suas estruturas com toda a sorte de empregos idiotas, e agora se vêem subtraídos em arrecadações, tornando toda a estrutura insustentável.
Daí ter surgido o mantra; comprem, comprem, comprem.
O primeiro a ter lançado tal mantra, que na língua de origem é shopping, shopping, shopping, foi George W. Bush logo após os ataques às torres gêmeas em onze de setembro.

Naquela época, com o medo suscitado pela onda de terror, o encolhimento da economia americana foi dramático, obrigando o último presidente daquele país a freqüentar as redes de comunicação com o famoso mantra, ao invés de mensagens de luto e solidariedade aos parentes das vítimas, parecendo ainda mais insano do que deveria ser, a julgar por aquele sorrisinho idiota pouco tempo após a tragédia.

Nosso Lula, também, ensaiou o mantra comprem, comprem, comprem, em tempos recentes, mas a única resposta que obteve foi um outro, greve, greve, greve.
Coisa também compreensível para a nossa realidade.

"A situação é extremamente preocupante e difícil. É o primeiro revés em mais de 50 anos para o crescimento mundial", declarou Strauss-Kahn em uma reunião em Genebra da OIT (Organização Internacional do Trabalho) na segunda-feira passada, em uma referência à previsão do FMI de uma contração da economia mundial em 2009 de entre 0,5% e 1%, divulgado no evento.

"É preciso agir agora estimulando a demanda, porque as políticas monetárias atingiram seus limites", concluiu.
Ou seja, mais uma personalidade a entoar o mantra, comprem, comprem, comprem.

Enquanto isso, o grito do planeta, doente, é poupem, poupem, poupem, provando que a falta de visão não é a única deficiência dessa galera.

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